domingo, 9 de novembro de 2008

Aprendizagem com as TIC-teorias da aprendizagem

“Oiço e esqueço, vejo e lembro, faço e aprendo”
João Paiva (3)

A partir do nascimento, o ser humano vive em constante processo de aprendizagem. Adapta-se e modifica-se para poder sobreviver no meio em que se insere. Mas como se aprende ? Será que basta memorizarmos conceitos? Será que só aprendemos descobrindo? Ou o processo é bem mais complexo? E qual a função das TIC no processo de aprendizagem ?
Decidi partir das leituras efectuadas, da minha experiência profissional e da utilização e/ou conhecimento de algum software e Recursos Educativos Digitais (RED´s) utilizados na sala de aula (ou fora dela) para construir a minha reflexão.
Se pensarmos bem, muitos dos RED´s que existem no mercado contêm exercícios de pedagogia directiva, em que o aluno, agente passivo, se limita a receber um feedback negativo ou positivo consoante o seu desempenho. A recompensa (pontos, estrelas…) pela sua prestação num determinado exercício funciona como um estímulo que o leva a continuar a tarefa.
Conheço um CD-rom de Língua Portuguesa, enviado por uma editora conceituada, que recorre a drills & practice, a processos mecânicos e repetitivos. As respostas são aprendidas por tentativas, por ensaio e erros (Thorndike) que podem ser repetidos várias vezes até que o aluno receba um feedback positivo ou decida abandonar o exercício. O objectivo deste tipo de tarefas é a memorização de conceitos de Língua Portuguesa pela repetição. A lei do efeito e a do exercício (Thorndike) são bem visíveis nas tarefas propostas. Como refere Fernando Albuquerque [1] , citando Papert, “a maioria dos programas educativos, reforça os aspectos mais pobres da educação pré-computador”.
Mesmo não utilizando RED´s, o docente recorre com frequência à lei do exercício, principalmente quando a memorização de conceitos ou da tabuada é considerada imprescindível. Neste caso, as escalas de reforço de Skinner estão presentes de forma intermitente: só reforçamos o comportamento ou a resposta que queremos ver repetida e até premiamos um aluno em caso de acerto. Com frequência, muito do behaviorismo também serve para estimular a aprendizagem!
Ao relembrar algumas das teorias da aprendizagem, conclui que, no processo de ensino aprendizagem, há um misto das três teorias: comportamentalista, cognitivista e contextualista. Já referi a primeira e apesar das críticas à memorização, parece-nos que esta e a memória são imprescindíveis à aprendizagem, à criatividade. Como esclarece Lobo Antunes (03), sem memória não há imaginação, pois para haver reconstrução tem que haver a recombinação de “ fragmentos do passado”. Nada nasce do nada porque o ser humano não é uma caixa vazia que se vai enchendo de conteúdos desligados uns dos outros. É necessário o processamento de informação, a existência de conhecimentos anteriores para a evolução.
Quanto à segunda, está presente em vários momentos da aprendizagem.
A teoria de que os alunos podem construir os seus próprios saberes é ideal e possivel até determinado ponto porque, para que alguns discentes adquiram conhecimento, o professor, que deixou de ser o mentor, o único detentor do conhecimento, continua a ser fundamental para ajudar a perceber, para explicar, para auxiliar. Diria que algumas descobertas feitas pelos próprios alunos estão na linha do construtivismo, mas é imprescindível a ligação dos novos conhecimentos a conhecimentos anteriores, e sem memória dificilmente será possível essa ligação.
Alguns softwares aplicam ainda as teorias do ensino programado de Holland (1958). Recentemente, tive a oportunidade de avaliar um recurso educativo digital em que o utilizador tanto podia aprender de forma behaviorista como de forma mais construtivista. Os exercícios deviam ser resolvidos segundo uma ordem pré-estabelecida para que a progressão fosse gradual, o aluno verificava de imediato a sua resposta devido aos exercícios de auto-correcção e o ritmo de cada aluno era respeitado visto que não havia limite de tempo para a resolução dos exercícios. O êxito era importante porque haveria um prémio final: um jogo.
Actualmente, dá-se ênfase às teorias contextualistas cuja figura principal foi Vygostky. De facto, o contexto influencia a aprendizagem e, mesmo que esta seja feita com recurso a meios informáticos, o contexto, independentemente do tipo de exercícios, terá um papel importante para o sucesso da aprendizagem. Independentemente da qualidade intrínseca dos software, é necessário ter em conta os contextos de aprendizagem específicos em que é proposta a sua utilização e exploração.
Na sala de aula, os alunos fazem trabalhos de grupo, trocam ideias, partilham interesses, criam materiais, colaboram, intervêm e cooperam. Aprendem fazendo. A relação e a interacção (as práticas sóciais segundo Luria) são peças imprescindíveis quer no processo de aprendizagem quer para o desenvolvimento pleno do discente.
A expressão do que vai na mente, o transformação do não verbal em verbal, a prática discursiva, a semântica, constituem também um processo de aprendizagem.
Pela observação dos colegas e pela sua auto-observação (Gonçalves) constrói-se uma identidade.
Neste prisma, as novas tecnologias são importantes: com os software digitais, os alunos podem colaborar à distância, terem acesso a múltiplas fontes de informação à escala global, comunicarem em tempo real, intervirem em fóruns de discussão, enfim, desempenharem um papel activo e aprenderem interagindo.
Contudo, questiono-me se isso será suficiente para uma aprendizagem de qualidade.
O computador e os instrumentos pedagógicos são classificados como mais ou menos behavioristas ou construtivistas consoante as práticas do professor, ie, o uso que se faz deles.
Uma vez que, segundo dados da OCDE (2005, 2006; Salomon & Globerson, 1987) [2] os alunos têm muitas vezes dificuldades em pensar, em resolver problemas e em aprender, devemos reflectir sobre o uso e o impacto das novas tecnologias para a construção da cognição: se o aluno deve ter um papel activo e consciente, urge pensar que conteúdos são utilizados para a capacidade de reflexão de pensamento crítico. Devemos reflectir sobre as dificuldades da transferência de conhecimentos e qual o papel das TIC nesse processo.
Na minha opinião, o professor deve encontrar um justo equilíbrio entre umas e outras das teorias supra-abordadas. Quer as teorias behavioristas quer as cognitivistas não devem ser rejeitadas, pois ambas são importantes para a construção da aprendizagem e da identidade.


Referências

1-Apresentações em power-point colocadas na plataforma (Aprendizagem operante, aprendizagem social, memória)
2-Costa, A. F. A aprendizagem como critério de avaliação de conteúdos educativos on-line. In Cadernos Sacausef 2, pp. 45-54.
3-Paiva, J. (2007). O fascínio de ser professor. Texto Editores.

[1] Costa, A. F. A aprendizagem como critério de avaliação de conteúdos educativos on-line. In Cadernos Sacausef 2, p.50.
[2] Costa, A. F. A aprendizagem como critério de avaliação de conteúdos educativos on-line. In Cadernos Sacausef 2, p.47.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Qualidade dos Artefactos Tecnológicos

“A ideia é que os humanos podem controlar o seu próprio comportamento não ‘a partir de dentro’, com base na compulsão biológica, mas ‘a partir de fora’, usando e criando artefactos. Esta perspectiva não é somente optimista no que concerne à autodeterminação humana. É um convite ao estudo sério dos artefactos como componentes integrais e inseparáveis do funcionamento humano”(Kuutti 1996)

Um artefacto é algo que vai servir para a execução de uma determinada tarefa e /ou para atingir determinados objectivos.
O conceito de qualidade tem a ver com o cumprimento das expectativas que o artefacto produziu no potencial utilizador mas também com as suas características e propriedades intrínsecas e contextuais, ou seja, para que um artefacto tenha qualidade, deve ter algo que o distinga de outro e que cative o utilizador de modo a que seja escolhido tendo em conta o seu contexto de utilização. Se tiver aptidão para atender às necessidades do utilizador, e se a sua utilização for “friendly”, as possibilidades de ser aceite serão claramente maiores.
É necessário que o criador do artefacto tenha em conta, não só o design e o aspecto estético mas também a sua utilidade e utilização. É preciso ter em linha de conta que utilidade e utilização estão intrinsecamente ligadas e são a condição sine qua non da existência do artefacto. Para quê a criação de um artefacto se não tiver condições de ser utilizado e utilizável, se não tiver um determinado potencial que justifique a sua escolha?
Se um artefacto se revelar ineficaz, imperfeito, demasiado complexo ou se não seduzir o utilizador, se não houver um “acto de amor” (EHN, 03), uma empatia, a relação dificilmente será pacífica. Se este não for ao encontro do Homem, das suas expectativas, das suas preocupações e necessidades, se não trouxer nenhum valor acrescentado na vida do utilizador, ou seja, se não atingir um determinado grau de utilidade e perfeição esperado, será abandonado.
No design do artefacto, normalmente da responsabilidade de uma equipa interdisciplinar, é necessário ter em conta, de acordo com Moggridge, a sua utilidade, o ser desejável e ao mesmo tempo acessível a todos (ter usabilidade) . A preocupação base do criador está nos valores humanos, nas pessoas que irão utilizar o artefacto, na estética, em valores subjectivos e qualitativos, e em factores humanos: o designer cria uma solução para dar prazer e satisfação duradoura e, portanto, cria um artefacto apto para o mercado.
A International Oraganization for Standartization estabelece a conformidade com um conjunto de normas para apreciação de qualidade, entendida como “O conjunto de características de uma entidade que influencia a sua capacidade de satisfazer necessidades reais e implícitas (ISO 8042) e estabelece um conjunto de normas:

-Funcionalidade (adequação, precisão, interoperabilidade, segurança)
-Fiabilidade (maturidade, tolerância a falhas, capacidade de regeneração)
-Usabilidade (inteligibilidade, operacionalidade, compreensibilidade)
-Eficiência (comportamento temporal, comportamento de recurso)
-Manutenção (facilidade de análise, facilidade de modificação, estabilidade e testabilidade)
-Portabilidade (adaptabilidade, capacidade de instalação e capacidade de substituição) (ISO/IEC 9126-1, 2001):

Contudo a proliferação de artefactos digitais e a sua cada vez maior omnipresença nos espaços e objectos humanos em convergência com a multiplicação dos media colocam novos desafios a vários níveis: sociais, técnicos e estéticos.
Não podemos esquecer que a qualidade se rege também pelo grau de interactividade e pelo controlo que o homem exerce sobre a máquina. Será o Homem a tomar a última decisão, ou seja, a aceitar ou a rejeitar o artefacto. Assim sendo, na concepção de um artefacto, é necessário atender às expectativas do utilizador de modo a que se crie uma interacção facilitadora e simplificada com o artefacto. É neste sentido que muitas empresas fazem prospecção de mercado e lançam produtos a título experimental.
O maior desafio é talvez o paradoxo da desmassificação apontado por (Brown e Duggit (1994). Desmassificação, quer física - os materiais perdem literalmente corpo passando a poder ser distribuídos globalmente – quer contextual e social, na medida em que a possibilidade de personalizar e fazer cópias individuais implica a perda de sentido de massificação inerente ao conceito de mass media ao implicar a perda de experienciação convergente e colectiva.
São estas novas condições sociais e materiais que actualmente se pressupõe sejam equacionadas no design de interacção, que soma assim à dimensão arquitectural, a de narrativa interactiva. Tal implica a convergência de conhecimentos técnicos e estéticos com o estudo de dinâmicas sociais
Artefactos desenvolvidos linearmente tendo em conta requisitos direccionados a determinadas finalidades previamente enunciadas, perdem terreno face à multiplicidade de ofertas que, criando maior exigência por parte dos utilizadores, lhe retiram a obrigatoriedade de se adaptar automaticamente, permitindo-lhe procurar o que melhor se adapta às suas necessidades específicas.
É neste contexto que se enquadra a aposta crescente no design participativo, orientado contextualmente, no qual a utilização e abordagem pelo utilizador são assumidas pelo designer no desenvolvimento do artefacto. Assiste-se assim à democratização dos processos de desenvolvimento dos artefactos que reconhecem ao utilizador um papel activo através da identificação e reporte de problemas, análise e avaliação de requisitos e design, participação em brainstorming, storyboarding ou workshops, testagem de protótipos etc., numa perspectiva colaborativa que acompanha todo o processo de desenvolvimento de um artefacto,
Estas questões colocam-se, com mais premência ainda, se se tratar de artefactos educativos/instrutivos/formativos. Conhecimento de estruturas cognitivas e modelos de aprendizagem, pressupostos pedagógicos, adequação da linguagem aos níveis etários dos utilizadores, são outros tantos factores a ter em conta pelos designers.
“A qualidade dos recursos não determina a qualidade da aprendizagem mas sustenta-a e contribui para ela. A qualidade do recurso não é inerente ao recurso em si, mas sim às decisões e comportamentos dos professores (ou dos alunos se estão no controlo) no planeamento e preparação da experiência ou actividade de aprendizagem e às decisões e comportamentos dos alunos durante a actividade proposta” (Becta, 2008).

Mais do que em qualquer outro, neste campo o focus da apreciação tem necessariamente que se deslocar do campo do “técnico” para aspectos pedagógicos e curriculares analisados ao longo do tempo, ” já que o que é um propriedade relevante na tecnologia só é entendida em função dos objectivos específicos e recursos activados durante a sua utilização” (Spagnolli, Gamberin, Gasparini, 2002) e se espera “que as TIC transformem, e não apenas complementem, a aprendizagem dos alunos” (Dillon 1985). Ou seja, mais do que análises de tipo descritiva, “factual” dos requisitos de um artefacto importam processos de avaliação/reflexão em contexto em que as dinâmicas geradas pela interacção artefacto-utilizador se assume como parte integrante do processo de design.

Conclusão
Pelo supra-exposto, podemos então concluir que os critérios de qualidade que devem ser aferidos têm a ver não só com as propriedades intrínsecas do artefacto, ie, as suas pretensões, mas também com qualidades extrínsecas: a sua utilidade, grau de interactividade, usabilidade, adequação e relevância. Em suma, um artefacto tem de ter em conta não só uma perspectiva individual mas atender às necessidades colectivas dos indivíduos e de uma comunidade.




Bibliografia

Amorim, Maria Amélia. Como olhar criticamente o software educativo multimédia. In Cadernos Sacausef 1

EHN, Pelle.2003. Participation in Interaction Design –actors and artefacts interaction. International symposium ‘Foundations of Interaction design’.Interaction Design Institute . Ivrea, Italy. November

Spagnolli Anna, Gamberini Luciano, Gasparini Daniele , 2002 Situated Breakdown Analysis for the Evaluation of a Virtual Environment

Moggridge,Bill Moggridge(s/d). A conversation about interaction design.
Sob uma óptica tradicional...
Algumas reflexões sobre o PTE

Os computadores parecem invadir tudo e todos. Será que já não é possível vivermos sem eles?
O PTE prevê, com o kit tecnológico, o acesso à Internet em todas as salas e a instalação de um quadro interactivo em cada 3 salas. Esta proposta pode ter efeitos perversos na medida em que, se não houver rotatividade das turmas pelas salas nas diversas disciplinas, alguns docentes estarão em vantagem na utilização de determinadas tecnologias em detrimento de outros.
Quanto ao Escola Simplex, espera-se que não se torne num escola (sem)simplex, pois os maus exemplos abundam. Na era da tecnologia, caiu-se na tentação de guardar os documentos em formato digital e tradicional, gastando-se tempo e papel em vez de racionalizar os meios!
É de destacar que, durante a leitura do PTE, fiquei com a sensação de que os professores de “antigamente” não foram capazes de nos guiarem para o saber!
Será que, sem o PTE, os alunos não aprendem e não se responsabilizam pelas suas aprendizagens? Então como foi possível aos indivíduos da nossa geração aprenderem e frequentarem com sucesso cursos superiores? Como foi possível a formação de tantos investigadores e escritores sumamente reconhecidos no estrangeiro? Como se incutiu na nossa geração a noção de democracia ? O fomento desta e a redução das disparidades e das injustiças não passa só pelo apetrechamento das escolas com TIC! Para quê gastar tanto dinheiro dos nossos impostos? Não haverá outras prioridades?
A instalação de meios de vídeo-vigilância não tornará a escola um paraíso da segurança. É sempre possível aos experts contornarem a função do equipamento de vigilância! Quantas escolas não foram já alvo de furto de equipamento informático?
Porquê o portfólio digital do aluno? Para o menino não andar carregado de dossiers? Eu ainda sou adepto do papel e umas apreciações feitas com a minha esferográfica de cor vermelha nunca provocaram graves problemas psicológicos!
E a formação de professores? Tendo em conta a situação actual, parece que a formação tornou-se algo de lucrativo ! Será que para utilizar os Magalhães, quadros interactivos e computadores que eu nem sequer pedi vou ter que pagar?
Bom, mas nem tudo o que é moderno é nocivo...senão, vejamos...
O PTE também aponta para o aumento da segurança no meio escolar. É certo que o cartão-escola pode proteger os discentes dos furtos e permitir um controlo da assiduidade, o que é óptimo para os meninos que tentavam iludir os pais imitando, nas justificações de faltas, a assinatura do encarregado de educação!
No ensino das línguas, o docente pode optar pelo intercâmbio virtual com escolas de outros países, permitindo desse modo o alargamento dos horizontes culturais dos seus alunos.
A generalização da Internet e a possibilidade de qualquer aluno poder manusear um computador contribuirá para a eliminação da exclusão digital. Já imaginamos o que é um aluno socialmente desfavorecido que nunca ouviu falar de chats, de fóruns, do mensenger, de downloads ?
Com as TIC um professor pode diversificar as suas práticas pedagógicas e cativar os seus discentes !
Afinal, o PTE até tem aspectos bem positivos! Se pensar bem, ainda poderei encontrar mais alguns do que os supra-enumerados!

Um educador tradicional...em vias de se tornar um educador mais vanguardista !
Sob uma óptica crítica (sem deixar de ter algo de tradicional)

Algumas reflexões sobre o PTE

Fala-se hoje na revolução das TIC. Na vida de todos, parece que o computador se tornou numa realidade incontornável…, por isso debrucei-me na apresentação do PTE e no Projecto de relatório do Conselho (Educação) para o Conselho Europeu. Este, para além de referir que o objectivo fixado em Lisboa é o de tornar a Europa " na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social ", acrescenta que um dos papéis da Educação é a promoção dos valores humanistas e o desenvolvimento do indivíduo, para que possa realizar todas as suas potencialidades e ter uma vida feliz. Contudo, questiono se o conceito de felicidade passa pela distribuição de computadores e de quadros interactivos em todas as escolas portuguesas! Não podemos esquecer os variadíssimos problemas sociais que os docentes têm que enfrentar diariamente nas escolas. Quando os alunos não tem dinheiro para o lanche, quando em casa existe fome, violência, alcoolismo ou toxicodependência, será que o PTE vai fazer com que aqueles esqueçam as suas dificuldades? A escola não existe sem a sua extensão: as famílias e o ambiente social.
A utilização das TIC numa sala de aula, espaço de referência da aprendizagem, onde no Inverno os alunos não conseguem mexer os dedos devido ao frio excessivo e onde no Verão o suor escorre pelo rosto devido às elevadas temperaturas que se fazem sentir nas salas, eis a dura realidade do meu dia-a-dia. Quando ligo o data-show o calor torna-se mais insuportável. Por mais dinamismo que um docente tente imprimir às aulas, é uma tarefa quase hercúlea manter os discentes atentos e com vontade de trabalhar, pelo que a relação Ensino/TIC continuará desigual de escola para escola enquanto aspectos fundamentais relacionados com o espaço físico continuarão a ter falhas crassas.
No ensino de massas, o fomento da diversidade e da tolerância, o trabalho em equipa e o desenvolvimento da autonomia podem ser incrementados não só pela consulta de sites na Internet mas também pelo diálogo na sala de aula, pela promoção de debates, pela discussão construtiva, pelos projectos escolares. São primordiais momentos de reflexão, opostos ao espírito agitado do fanático computacional, para impelir e cimentar a aprendizagem bem como a construção de conhecimento.
A minha experiência tem-me ensinado que os alunos privilegiam a troca de ideias, de conhecimentos e de opiniões na sala de aula (tão importantes para desenvolverem a expressão oral e construírem o seu pensamento) em detrimento da consulta de sites para a realização de trabalhos! Por vezes, são as questões sociais, a discussão à volta dessas, a interactividade (pois também existe sem computadores!) que estimulam a curiosidade e o interesse dos jovens.
As estratégias pedagógicas devem ser variadas assim como os recursos! O computador, enquanto constituir uma novidade, resultará. Mas até quando e até que ponto? Ainda me lembro do tempo em que os alunos vibravam com uma transparência ou a audição de um CD!
Não podemos, neste contexto, olvidar uma questão crucial: a redução do abandono escolar. Compete-nos questionar se o papel os psicólogos, dos assistentes sociais, dos mediadores de conflitos e dos professores de apoio não será mais premente do que o da introdução das TIC. As crianças não se podem alimentar só de tecnologia, precisam de afecto, de emoções, de quem os oiça não só virtualmente mas presencialmente. O gesto humano, um sorriso, uma palavra podem fazer mais do que centenas de Magalhães!
Por isso, as novas tecnologias desempenham, no processo de Ensino/Aprendizagem, um papel e uma relevância relativos.
O computador, por si só, não promove nem o sucesso nem a autonomia do aluno, tanto mais que um software não é pedagogicamente auto-suficiente.
Como refere Guilhermina Miranda, a propósito das características dos ambientes Logo in Resultados das Investigações sobre os Diferentes Ambientes de Aprendizagem Informatizados, a ideia de que o aluno pode aprender só pela descoberta é contraposta por Littlefield (1992), ao analisar o livro Constructionism, editado por Harel e Papert (1991) quando afirma que a aprendizagem efectiva requer ensino estruturado e mediado pelo professor. Por outro lado, o saber-estar e o saber-ser não são incutidos pelas novas tecnologias! Estas até provocam com frequência uma cisão familiar e uma alienação que a “second-life” torna por vezes incontrolável. O mundo real e o mundo virtual não podem ser confundidos!
O insucesso escolar está também intimamente ligado à expressão escrita e à memória. Não podemos elaborar textos sem sabermos palavras, nem é possível avançarmos para o estádio da criatividade (tão presente nos curricula) sem dominarmos conceitos e se não houver memória. Neste prisma, o professor continua a desempenhar um papel primordial.
Dantes, os alunos frequentavam a biblioteca escolar, consultavam livros, tiravam apontamentos, seleccionavam o mais importante! Agora muitos limitam-se ao simples “copy-paste”! Só o docente, com as suas práticas pedagógicas, pode erradicar esse péssimo hábito e encorajar a distinção entre o acessório e o essencial e promover a compreeensão, a semântica e evitar o low-profile .
Não podemos esquecer que Estados-Membros reconhecem a importância de uma formação adequada dos professores. Talvez esta seja uma das principais falhas do PTE.
É na sólida formação dos professores que se deveriam concentrar muitos dos esforços, se quisermos operadores movidos pela confiança que integrem estas tecnologias nas salas de aula. Com efeito, muitos professores são reticentes na exploração das variadíssimas potencialidades do computador. A formação dos funcionários no âmbito das TiC também não é divulgada.


Em conclusão, o espaço educativo deve promover o equilíbrio. A felicidade não pode ser sinónimo de facilidade!
O PTE pode passar por uma opção organizacional mas é no seio da escola e em particular no espaço da sala de aulas que o docente deve ser capaz de fazer a síntese entre o tradicional e o actual.
O computador pode trazer vantagens pedagógicas, por exemplo no ensino das línguas, na extrapolação das fronteiras, no aumento da cultura geral, no conhecimento do mundo, mas as TIC não são a cura milagrosa dos problemas da educação.
Nem tudo o que é tecnológico é eficiente e perfeito. Se bastassem os computadores, então substituiríamos as aulas presenciais por aulas à distância e os professores poderiam leccionar a partir de casa, evitando situações de indisciplina e de violência! Mas será que incentivar e motivar os alunos no espaço e no tempo escolar não é uma riqueza para a aprendizagem?
A implementação de um meio-termo entre o real e o virtual, entre a era do digital e do suporte papel é imprescindível. Um computador não substitui um professor conselheiro, mas pode ajudar a aumentar o gosto pela aprendizagem !

Integração Curricular das TIC


Potencialidades das TIC